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quarta-feira, 10 de abril de 2013

Até quando, precatório? REVISTA brasiliaemdia.


Até quando, precatório?


A advogada Aparecida Maria da Silva é uma das mais requisitadas em São Paulo e em todo o Brasil. Formada em Direito pelo Centro Universitário Padre Anchieta de Jundiaí, ingressou na Ordem dos Advogados do Brasil com pós-graduação em Direito do Trabalho, pela Pontifícia Universidade Católica (PUC), e com o curso de Docência para Magistério Superior, pela Fundação Getúlio Vargas.
Atualmente ela se dedica à execuções para a cobrAdv3 7945ança de dívidas da Fazenda Pública que não processam pela penhora de bens dos entes púbicos, mas pela expedição de uma ordem de pagamento para a inclusão da dívida no orçamento público. Esta ordem é mais conhecida como precatório requisitório.
Para ela, ao aceitar os precatórios para compensação de tributos, a Justiça impulsionou o mercado - inclusive em vários estados brasileiros que já possuem leis autorizando a compensação direta de tributos com precatórios, fazendo com que o valor do mercado do precatório se eleve.
A situação nos tribunais, porém, é de desordem, de acordo com a própria ministra do STJ, Eliana Calmon. Leiam mais nesta entrevista com a advogada Aparecida Maria da Silva, que sabe tudo a respeito. 
- Como surgiram os precatórios no mercado e como evitar a inadimplência?   
- Este mercado paralelo de precatórios na realidade surgiu pela inadimplência recorrente da administração pública. Se o credor do precatório tivesse a segurança de receber seu crédito rapidamente, não teria a necessidade de negociá-lo neste tipo de mercado que só existe por causa do atraso recorrente da administração pública. As pessoas se submetem a receber menos, com maior rapidez.

- E sobre os precatórios?
- Os precatórios são formalizações de requisições de pagamento de determinada quantia, superior a 60 salários mínimos por beneficiário, devidos pela Fazenda Pública, em face de uma condenação judicial. 
As execuções para a cobrança de dívidas da Fazenda Pública (União, Estados, Municípios, Autarquias e Fundações de Direito Público) não se processam pela penhora de bens dos entes públicos, mas pela expedição de uma ordem de pagamento para a inclusão da dívida no orçamento público. Esta ordem é conhecida como precatório requisitório.

- Como ficam as dívidas de pequeno valor?
- Excluem-se da expedição de precatório as dívidas de pequeno valor, assim consideradas inferiores a 60 salários mínimos para as dívidas da Fazenda Federal, a 40 salários mínimos para a Fazenda Estadual e Distrital e a 30 salários mínimos para a Fazenda Municipal, salvo lei estadual, distrital ou municipal que disponha em sentido diverso. São as chamadas requisições de pequeno valor, popularmente conhecidas como RPVS, que na prática deveriam possuir tratamento diferenciado em relação aos precatórios.
Atualmente o mercado de precatórios está bastante aquecido e o poder judiciário tem autorizado em alguns casos a compensação de tributos, aceito como garantia nas execuções fiscais. Em outros casos, autoriza o pagamento mensal dos tributos com o precatório como dinheiro.

- E sobre os tributos?
- A justiça, ao aceitar os precatórios para compensação de tributos, impulsionou o mercado de precatórios. As empresas devedoras recorreram a este recurso para comprá-lo com deságio e pagar seus tributos com descontos consideráveis. O credor recebe menos, mas recebe com maior rapidez.
Para a administração que não autorizar esta compensação administrativamente, acabará por ter que fazê-la pela via judicial, sem que exista um planejamento. Vários estados brasileiros já possuem leis autorizando a compensação direta de tributos com precatórios, o que faz com que o valor de mercado do precatório se eleve.

- O que o estabelecimento de regras para o pagamento da dívida pública representou de fato para a questão dos precatórios? Melhorou ou piorou?
- Ainda que alvo de muitas críticas, a emenda 62/2009 foi o início de se tentar colocar a casa em ordem. A situação começou a ter um rumo e daí descobriu-se o quanto esta casa está bagunçada. Afirmar que piorou é complicado porque mais do que estava era impossível. Esta emenda ficou conhecida como a emenda do calote, já que obriga a administração pública a pagar apenas de 1,5% a 2% do previsto em seu orçamento anual para pagamento dos precatórios. Com isso, existem credores que observada a ordem cronológica, somente receberão seus créditos em 2022. Um dado preocupante é que a cada dia são gerados mais precatórios. Antes da emenda 62 quem podia pagar mais agora paga 1,5% do orçamento e está dentro da lei. Antes existiam os que não pagavam nada, pagavam a quem queriam, existindo muitas fraudes na administração do pagamento dos precatórios. Muito ainda tem que ser melhorado, mas acredito que a emenda 62/2009 ainda que tenha falhas a serem revistas, é o começo da moralização.

- O CNJ acatou uma proposta da OAB-SP de criação de um comitê gestor para os precatórios de São Paulo. Na sua opinião, que impacto essa comissão pode ter de fato sobre a questão dos precatórios?
- A expectativa é muito grande. A situação de vários tribunais pelo país está caótica. Como já dissemos acima, os precatórios são os títulos de crédito que os credores possuem contra a administração pública, depois de vários anos aguardando por uma sentença judicial que pode ter tido como causa uma desapropriação, uma ação indenizatória. Após o término do processo, tem início uma nova batalha: a de recebimento do precatório, ocorrendo casos em que o credor o deixa de herança e não consegue em vida receber seus direitos.
Depois de anos na fila para receber, após a administração pública ter efetuado o pagamento cujo valor é depositado para o Tribunal de Justiça, começa outra espera: a de pagamento pelo Tribunal.
Para se ter uma ideia da gravidade da questão, os Tribunais que recebem esses valores não possuem estrutura para administrar toda essa verba.

- E como ficou a Corregedoria Nacional da Justiça?
- Para a ministra Eliana Calmon, a situação é de “desordem”. Ela chegou a afirmar que alguns servidores responsáveis pelo setor acabam se locupletando diante de tanta desordem.
Com a definição sobre as atribuições do CNJ, a corregedora agora está focada na solução dos problemas dos precatórios, que considerando todo o país, soma um passivo de cerca de R$ 84 bilhões. O CNJ pretende auxiliar na reorganização nos tribunais e dos setores responsáveis pelos precatórios, buscando combater e evitar casos de corrupção envolvendo o pagamento dos títulos.

- O mercado dos precatórios também tem sido alvo de agiotas e outros aproveitadores. Que tipo de leis devem ser propostas e implementadas pelos governos (municipal, estadual e federal) para regulamentar esse mercado?
- Como em todos os meios, este também possui suas vítimas, que muitas vezes por causa do desespero, acabam vendendo mal seus títulos ou comprando precatórios imprestáveis. É preciso cautela ao se adquirir ou vender um precatório, recomendando-se sempre o acompanhamento de um advogado.
O precatório é um titulo de crédito emitido contra a administração pública. É um patrimônio e deve ser cedido mediante escritura pública de cessão de créditos e registrado no Tribunal de Justiça. Os cuidados para adquiri-lo devem ser os mesmos que os seguidos ao se comprar um bem imóvel, por exemplo, consultando certidões negativas de débitos fiscais, processos cíveis e trabalhistas. É preciso conhecer o passado de quem vende e se o proprietário possuir dívidas que vierem a recair futuramente sobre esse precatório, o comprador pode acabar ficando apenas com o direito de regresso contra quem vendeu.
Não acredito que seja necessária a criação de novas leis. É necessária muita prudência e o acompanhamento de um bom advogado em transações deste tipo.

- Por que certas empresas ou escritórios de advocacia decidiram atuar como intermediários na comercialização de precatórios? Qual o grau de risco em tal investimento?
- Existem administradoras de créditos especializadas no assessoramento para a venda e aquisição dos precatórios. Aos escritórios de advocacia é proibida esta intermediação comercial. Os advogados podem prestar assessoria, fazendo uma verdadeira auditoria desde o início do processo que gerou o precatório, para evitar a compra de um título que contenha vícios ou cuja decisão que o originou ainda seja passível de uma ação rescisória. Caso não sejam seguidos estes passos, o risco neste tipo de investimento é muito alto. A pessoa pode perder tudo o que desembolsou para adquirir o título de crédito. Para quem vende é importante saber qual o valor atualizado do seu crédito e qual o seu lugar na fila. Muitos advogados respondem a processos por estelionato, por enganarem seus clientes, comprando os precatórios por valores defasados de quem já estava muito perto de receber. É preciso muito cuidado ao adquirir e ao vender um precatório. Precatório é dinheiro!

- Como funcionam os leilões de precatórios? Para quê eles servem? Quem pode participar e o que cada parte envolvida pode ganhar (ou perder) com esse pregão?
- A administração deve separar o percentual de 1,5% a 2,0% (dependendo da região) de seu orçamento anual para o pagamento de precatórios, sempre respeitando a ordem cronológica. Mesmo respeitando esta previsão de destinação do orçamento anual, a administração pode lançar mão de outros meios para liquidar seu passivo com precatórios, quer seja pelo recebimento dos precatórios para pagamento de tributos, quer seja pela realização de leilões.

- Por que leilões?
- Nesses leilões a administração pública oferece aos seus credores um valor bem inferior ao que realmente deve - cerca de 30% a 50 % a menos que o valor de face do precatório, onde vende quem quer e sempre quem compra é o devedor. O grande problema é que existe o questionamento acerca da constitucionalidade destes leilões, pois se o estado possui verba sobrando para comprar precatórios com deságio, deveria liquidar quem está aguardando na ordem cronológica. Entendo que o estado fere esta ordem ao realizar estes leilões, ainda que tenha cumprido com a previsão da emenda 62/2009.

- E como fica o estado de São Paulo?
- O governador do estado de São Paulo editou o decreto lei 57.658/11 dando cumprimento à emenda e autorizando a realização de um leilão de precatórios este ano. A OAB-SP já manifestou que ingressará com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), requerendo a declaração da inconstitucionalidade do leilão, já que o leilão terá sempre um único comprador e o estado e os municípios pagarão o que quiserem, aproveitando muitas vezes da extrema necessidade de quem vende. Uma boa saída para esta questão seria a administração pública não oferecer óbices para o recebimento de tributos com os precatórios, aí sim, seria um excelente negócio. 

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